CORRENDO COM OS LOBOS - O
dia 1° do ano de 2007 escurecia e se preparava para a noite, mas dentro de mim
um sol nascia, esplendoroso e me preparava para uma nova vida. Abri o livro
Mulheres que Correm com os Lobos, saído do universo mental da psicóloga
junguiana Clarissa Pinkola Estes, ainda de manhãzinha. E não fechei mais. A
cada página sorvia a mim mesma, retratada nas fábulas utilizadas. A cada
capítulo me entendia melhor e mais me amava. Eu não estava errada, nunca
estive. Foi a sociedade que cortou nossos cabelos e nos adestrou. As lobas foram
domesticadas e afastadas de sua essência. Meu Deus, como eu me entendia agora -
minhas reações, revoltas, medos e posturas contrárias à maré. A leitura me
fazia forte e uma loba adulta voltava para os da sua espécie. Ali
aprendi a dançar a vida e a roer os ossos para reconstruir. Novas dificuldades
vieram, mas nenhuma encontrou a antiga sofredora – hoje ela ainda chora, mas
seu choro é permeado de raios de esperança, mesmo dentro da tempestade.
A INÉRCIA - Sempre
se ouviu que quem cedo madruga Deus ajuda e quem procura sempre alcança, mas
não acredito que se tenha levado muito a sério. Porém descobri na esteira o
poder dilapidatório contra a inércia. Nas horas nela aplicadas, durante a
madrugada muitas vezes, imprimi um novo ritmo à minha cabeça confusa. Ordenei
as ideias tanto quanto na época em que fiz psicoterapia transpessoal. Nas
passadas aceleradas e constantes revivi o passado, ajustei o presente e
projetei o futuro. Lembro bem que recitava intermitentes mantras quando ficava
difícil concatenar as situações vividas com as vindouras. O limbo estava ali e
eu, bem no meio dele. Emaranhada nas algas lamacentas, só me restava espernear
para sair, ou ser tragada para sempre. Me agarrava com força ao suporte da
esteira, fixava o olhar em algum ponto à frente e ia. Aumentava a velocidade
até a exaustão, mas saía dali revigorada.
O RESGATE - Sou
jovem. Sempre fui, sempre serei. Espírito e alma jovens. Posso ter 60, 70 anos
que continuarei jovem, pois respiro juventude. É característica física, questão
hormonal, a natureza da pessoa, como definiam os antigos – é a minha natureza.
Quando namorei um cara mais velho, senti na pele o contraste entre o moderno e
o obsoleto. Ideias cristalizadas, posturas engessadas, crenças do baú,
conceitos jurássicos. E o pior é que eu o amava. A inteligência vivaz de
Mercúrio e a estabilidade de Saturno estavam com ele e me fascinavam, enquanto
a instabilidade da Lua e os humores de Marte estavam comigo e me
desestabilizavam a toda hora. Mas como juntar alhos com bugalhos, quando queijo
com goiabada é a grande jogada.
E
mulher é bicho do diabo. Quando se apaixona, se dá por inteira. Não se contenta
com as partes. Quer fusão generalizada e arruma... confusão. Vira camaleoa e
muda tudo em si, se preciso for. É capaz de fazer uma lipo nos desejos e
aspirar até os limites os extras dos prazeres pessoais. Tudo pelo bem social –
um bom clima no lar doce lar dos dois.
Quando
se dá conta, já se perdeu de si. Entre os fragmentos procura dar um molde ao
que era e vê que o que restou passa longe. Então chora, como se as lágrimas
pudessem lavar o estrago feito. Mas elas cavam sulcos mais profundos e mostram
a imensidão do abismo. Se
arma e parte na caça de si mesma. Esmurra o emocional até virar razão, lança
mão das correias que usou no próprio corpo e prende o tempo para não ser tarde
demais. Ela quer a vida de volta. Cada segundo seu que jogou ao léu. E quer
agora, porque amanhã, terá novos e jura para si mesmo que nunca mais vai perder
um segundo sequer. A
chama reacende e a loba rosna à procura de si mesma. Ela sabe que ainda está
lá. Basta tirar os galhos secos que a ocultaram por um tempo. E no céu, a lua
cheia a espera. Para vê-la sorrir e ajeitar o cabelo, como antes.
AGORA CHEGA - Chega
o dia que você acorda e só quer dizer: estou cheia de suas velhas fórmulas,
obsoletas e ineficazes. Deixa eu fazer do meu jeito. Neste momento você toma
consciência de que para mudar uma situação ruim basta mudar o próprio jeito de
agir. E pára de tentar mudar o outro. Com isso você cresce. E o horizonte à sua
vista se agiganta.
O
outro pára no impacto da revelação. Mas com o tempo tomará uma atitude – seja
se encolher e posar de vítima ou espernear e correr atrás. “Ele me envelheceu
com seu jeito antigo de postergar tudo. Enfileirar atitudes (nunca tomadas)
para um dia no futuro. Logo eu, dona da ação. A senhora do próprio destino. To
fora!”
Você
então, já crescidinha, vai ocupar seu lugar no mundo. Abre suas asas numa
envergadura nunca antes sonhada e se lança num espaço até então não pisado. Ou
percorrido pelas mãos e olhos do outro. O chão te recebe e convida a fincar
raízes, mas você quer o céu. As nuvens teimam em impedir o olhar de atingir o
ápice, até mesmo porque seus olhos desacostumaram de ver tão longe. Mas aos
trancos e barrancos você prossegue e ao final de cada dia, a vida se encarrega
de repor. A primeira atitude é mudar alguma coisa. Cortar ou pintar o cabelo
serve. Comprar sapato, bolsa ou roupas novas também. Fazer uma massagem. Sair
fica para depois. Primeiro é preciso por a casa em ordem. Quando
mergulhei nos meandros da energia universal que envolve o homem, buscava força
para viver. E encontrei.
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